Abércio (em grego Ἀβἑρκιος
/ Aberkios, var. Ἀουἰρκιος), conhecido como Santo
Abércio, bispo de Hierápolis (Frígia, cidade próxima a Esmirna e há muito
desaparecida), foi um religioso que combateu vigorosamente os cultos pagãos,
que acabaram prosseguindo graças a um decreto do Imperador Marco Aurélio.
A beleza e pureza das antigas festas rituais
dos gregos, bem como a inocência e nobreza dos Mistérios Elêusinos, haviam sido
pervertidas de forma crescente à medida que se estendiam pela Península
Itálica, Magna Grécia até sua posterior adoção pelos romanos. As bacanais
ferozes do Século II nada tinham a ver com a essência dos ritos dionisíacos,
surgidos centenas de anos antes. O cristianismo nascente foi confrontado com a
degeneração dos antigos deuses. Assoberbado, Abércio rogava ao “Deus das
misericórdias, criador e conservador providente do mundo” que protegesse “as
ovelhas fiéis dos ‘perigos do lobo que ameaçava devorá-las’ ”. Um dia teve um
sonho: um jovem lhe entregava um bastão e lhe dizia: “Levanta-te, Abércio, vê e
castiga em meu nome as apostasias deste povo.”
Sem pensar duas vezes, iniciou sua empreitada
e sozinho empreendeu um difícil combate, inicialmente desalentadores, mas
conseguindo ao final inúmeros milagres, que determinaram sua vitória. Venerado
pelo povo antes mesmo de sua morte, Santo Abércio mereceu o título de
“Isapóstol”, “Igual aos Apóstolos”. A Igreja Grega propagou seu culto, que logo
foi incorporado à Igreja Latina. Passado muito tempo, acreditava-se que a
história e até a existência desse personagem não passava de uma lenda, até que
o arqueólogo William Ramsay descobriu seu túmulo e o epitáfio que o próprio
santo havia mandado gravar nele ele.
O texto é bastante grande, então transcrevemos
apenas os seguintes fragmentos:
"Meu nome é Abércio./ Sou discípulo de um
pastor casto que apascenta/ seu rebanho de ovelhas por montes e planícies.../ A
fé me acompanhou por todas as partes e foi ela/ quem me levou para comer um
peixe muito grande e puro,/ que uma
virgem imaculada pescou./ Ela mesma o deu interiamente a seus amigos
para que comessem;/ ela, que tem um vinho delicioso/e o oferece junto com pão."1
O texto é muito interessante do pontos de
vista histórico e teológico e, para tanto, segue abaixo uma tradução completa:
Miniatura do Menológio de Basílio II |
“Cidadão
de uma cidade eleita, fiz para mim este monumento estando vivo para ter, no
momento oportuno, uma sepultura para meu corpo. Meu nome é Abércio e sou
discípulo de um casto pastor que apacenta rebanhos de ovelhas por montes e
planícies, o que tem grandes olhos que olham para baixo por todas as partes.
Este mesmo, com efeito, me ensinou as Escrituras da vida, dignas de fé (zoés grámmata pistá); Ele me
enviou a Roma para contemplar meu palácio real e uma Rainha de vestido e
sandálias de ouro; vi um Povo que tem um selo luminoso (lamprán sfrageida). Visitei também a planície da Síria e
todas as suas cidades e, tendo cruzado o Eufrates, Nisibi; e em todas as partes
encontrei companheiros de fé (synomilous); andei
de cidade em cidade tendo Paulo comigo, e a fé me guiou em toda parte, e em
toda parte me preparou por alimento o pescado da grande e pura fonte que a
casta virgem sempre leva e dá de comer a cada dia aos seus amigos, tendo um bom
vinho que dá com o pão. Eu, Abércio, ordenei que essas coisas fossem escritas
na minha presença, com a idade de setenta e dois anos. Ele que compreende e
pensa o mesmo que eu (que compartilha a mesma fé) rogue por Abércio. Que
ninguém ponha outro em meu sepulcro, ou então pagará 2.000 áureos ao erário dos
Romanos e 1.000 à minha querida pátria.2
Podemos observar a referência implícita ao Canon
das Escrituras (as escrituras dignas de fé); a posição especial da Igreja
Cristã, apresentada como uma Rainha com vestido e sandálias de ouro; a
importante expansão do Cristianismo para o Oriente, não apenas
na Síria, mas para além do Eufrates; a companhia do Apóstolo Paulo parece fazer
referência a uma edição das Epístolas Paulinas, que o peregrino leva consigo
numa viagem; os símbolos eucarísticos, exprimidos de modo que não sejam
diretamente inteligíveis ao profano (segundo a chamada disciplina do arcano): o peixe,
cujo acróstico em grego (IKHTYS) representa o Cristo; a casta virgem,
que representa a Igreja (com alusão também à Virgem Maria), distribuindo o
pão e o vinho. Todo este conjunto simbólico, junto à beleza e elegância da
expressão, justificam a afirmação de J. Quasten, que chamou este epitáfio de “a
rainha das inscrições cristãs” (cf. J. Quasten, Patrologia, Vol. I). A
inscrição data do período entre os anos 190 e 216. A esta segunda data
corresponde uma inscrição encontrada pelo mesmo Ramsay em Alexandria e,
evidentemente, copiada daquela de Abércio. Aos primeiros anos da década de 190
pode-se datar o documento anônimo Anti-montanista, registrado por Eusébio de
Cesareia em sua História Eclesiástica (V,16,3), dedicado pelo autor a Avircio
Marcelo.3
Notas:
1.
Teorema de los sueños, páginas 239-240
2.
Trad. Claudio Pierantoni, inédita
3.
Cf. Eusebio de Cesarea, Historia
Eclesiástica, Texto, versão espanhola, introdução e notas por A.
Velasco-Delgado, Madrid 1997, vol. I, págs. 309-310
Bibliografia:
Jorge Sergio, (1998). Teorema de los sueños.
Editorial Continente, Buenos Aires,. ISBN.
Tradução e
Adaptação:
Gisèle Pimentel
Fontes:
https://es.wikipedia.org/wiki/Abercio
http://levangileauquotidien.org/zoom_img.php?frame=38517&language=FR&img=&sz=full
https://el.wikipedia.org/wiki/%CE%8C%CF%83%CE%B9%CE%BF%CF%82_%CE%91%CE%B2%CE%AD%CF%81%CE%BA%CE%B9%CE%BF%CF%82#/media/File:Abercius_of_Hieropolis_(Menologion_of_Basil_II).jpg
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